O Grito que Permanece

Todo ano, a cidade se veste de festa. O Divino Espírito Santo desce do céu para caminhar com o povo, entre fitas, bandeiras, tambores e promessas. Os palmitos entram em cortejo. Não apenas folhas, mas símbolos. Entram os lavradores com seus chapéus gastos pelo sol e a força da terra nas mãos. É a ancestralidade dos corpos, a fé encarnada na cultura, a inculturação da esperança. Mas há um traço que permanece, mesmo quando as bandeiras são recolhidas. Um traço que não se dissolve nas águas da procissão. Está lá, na parede da catedral. Uma pichação! Uma escrita anônima, rude, talvez marginal — mas viva. Não foi feita no dia seguinte a um episódio específico. Não foi um protesto direto. É mais profunda. É uma marca que fica. Dizem que houve um tempo — ou muitos — em que o templo fechou suas portas aos corpos cansados. Que em plena Festa do Divino, quando os fiéis buscaram abrigo, banheiro, dignidade, encontraram não acolhimento, mas recusa. O sagrado não abriu a porta para...