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Mostrando postagens de outubro 20, 2025

Entre o Estado e o Comum: Boulos, Lula e a dialética do poder popular

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Há gestos que dizem mais que palavras. A nomeação de Guilherme Boulos para a Secretaria-Geral da Presidência da República é um desses momentos em que o tempo histórico se condensa num ato político. O líder que nasceu das ocupações urbanas chega agora ao coração do governo — e o que parece mera troca de cargos revela, sob a superfície, um movimento de fundo: o reencontro entre o Estado e o povo. Desde o início do terceiro governo Lula, a esquerda vive um dilema que é, antes de tudo, dialético . Para governar, é preciso conciliar forças diversas — o centro institucional, os setores econômicos, as alianças parlamentares. Mas para transformar, é preciso manter acesa a chama popular que lhe deu origem. Entre a necessidade de governabilidade e o desejo de transformação, o governo caminha sobre a corda bamba do possível. A nomeação de Boulos é a tentativa de equilibrar novamente essa tensão , trazendo de volta para o Planalto a pulsação das ruas. O novo ministro não é um nome qualquer. ...

O fetiche do rombo e a liturgia da culpa

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Há notícias que não informam — consagram. A manchete da CNN sobre o “rombo histórico das estatais” é uma dessas peças raras em que o jornalismo de dados se traveste de sermão. Números, percentuais e gráficos aparecem como relíquias de fé, exibidos para confirmar o dogma de que o mercado é a medida do real. O Estado, reduzido a corpo pecador, deve purgar seus gastos até reencontrar a graça fiscal. O leitor é convidado a se ajoelhar diante de um altar contábil. O déficit vira pecado, e o ajuste, penitência. Nenhuma contextualização histórica ou estrutural — como o impacto internacional do preço do petróleo, das guerras ou da política de juros — é oferecida. O dado é absoluto, o número fala por si, o veredito já está dado. A ciência deixa de ser investigação e se transforma em oráculo. Por trás da linguagem técnica esconde-se uma moral antiga: a crença de que governar bem é gastar pouco, e que investir no social é ceder à tentação. O discurso do “rombo” não é neutro; é narrativa de po...