Tránsito Soto, Márcio Alvino e a permanente exclusão
Há personagens que não pedem licença à história; operam nela. Tránsito Soto, em A Casa dos Espíritos , é uma dessas figuras. Ela não governa, não legisla, não moraliza. Conhece os atalhos — e por isso atravessa. Sua força nasce do colapso: quanto mais frágil o centro, mais indispensável a margem que resolve. Esse é o ponto de contato com um tipo de poder contemporâneo que, no Brasil, se consolidou após 2016: o poder que administra a exclusão em vez de superá-la. No filme, quando a ordem formal entra em crise, é Tránsito quem garante passagem. Não por virtude abstrata, mas por inteligência prática. Ela é a ética da sobrevivência em um sistema injusto. A narrativa não a romantiza: expõe o paradoxo. Sua eficácia depende da permanência da injustiça. Se a estrutura mudasse, o seu lugar deixaria de existir. Transponha o mecanismo para o presente. Em muitas cidades, APAE(s) e Santas Casas tornaram-se casas institucionais da carência: salvam vidas, acolhem famílias, sustentam o cotidiano — e, ...