Babel Sensivel — Repositório de escuta digital, sensível e emancipatória


Este repositório reúne ferramentas, bibliografia e exemplos comentados sobre a captação, interpretação e transcrição sensível de som e emoção em tempo real, entendendo esse processo como um caminho para a superação simbólica do Mito de Babel. Propõe-se aqui um idioma comum digital, relacional e pluriversal, capaz de transcrever culturas e expressões sem apagá-las e, pelo contrário, construir entendimento e práticas para respeito às diferenças, à diversidade e avançar na construção coletiva do saber.

1. Núcleo Bibliográfico

Consideração Crítica sobre as Referências Técnicas

Embora este repositório valorize o instrumental técnico e as contribuições científicas aqui reunidas, é necessário reconhecer que boa parte das referências técnicas e científicas parte de pressupostos epistemológicos conservadores, funcionalistas e universalistas.

Essas abordagens:

  • Reduzem emoções a estados discretos e mensuráveis;
  • Abstraem o contexto cultural, histórico e simbólico do sentir humano;
  • Convertem subjetividade em dado operacionalizável;
  • Reproduzem uma concepção tecnocrática de neutralidade, que ignora as condições materiais e políticas da fala.

Além disso, é necessário manter um olhar crítico-libertário sobre o uso de religiões, ideologias e tradições como fundamentos de homogeneização simbólica, frequentemente instrumentalizados para apagar a diversidade, sufocar o dissenso e impor uma ordem cultural falseada sob o manto de “valores universais”.

Este projeto se propõe a:

  • Usar o instrumental técnico de modo situado, ético e emancipador;
  • Conectar saberes técnicos com saberes populares e ancestrais;
  • Criar uma escuta digital que não normatize a emoção, mas a acolha em sua complexidade, pluralidade e potência política;
  • Superar o Mito de Babel não por meio da unificação violenta, mas pela criação de um campo comum de escuta onde todas as vozes possam se fazer ouvir sem serem assimiladas.

1.1 Referências Técnicas e Científicas

  • Rosalind PicardAffective Computing (1997): marco fundador da computação afetiva.
  • Lisa Feldman BarrettHow Emotions Are Made (2020): crítica à ideia de emoções universais.
  • James RussellA Circumplex Model of Affect (1980): representação bidimensional das emoções.
  • Paul EkmanEmotions Revealed (2003): emoções básicas e expressão facial/sonora.
  • Rafael Calvo e Sidney D'MelloPositive Computing (2014): bem-estar emocional mediado por tecnologia.

1.2 Artigos e Teses em Português

  • Publicações do INCT-IMA, Fiocruz, USP e UFRJ sobre percepção auditiva, cognição e emoção.

 

2. Núcleo Filosófico

Walter Benjamin — Filósofo e crítico alemão, autor de "A Tarefa do Tradutor". Propõe a existência de um "idioma puro", uma espécie de horizonte simbólico que toda tradução busca tocar. Sua obra ilumina a potência da linguagem como ponte entre mundos históricos e culturais.

Jacques Derrida — Filósofo francês, fundador da desconstrução. Questiona a possibilidade de tradução plena e revela os jogos de poder e exclusão presentes em toda linguagem. Nos ajuda a pensar os limites e as falhas inevitáveis de todo sistema simbólico universalizante.

Vilém Flusser — Pensador tcheco-brasileiro, autor de uma filosofia das mídias e da técnica. Defende que os gestos, aparelhos e linguagens técnicas reconfiguram a própria consciência. Sua ideia de “código” como extensão do gesto comunicativo é central para pensar o digital.

Cornelius Castoriadis — Filósofo grego-francês, formulador do conceito de “imaginação radical” e “instituição do social imaginário”. Defende que o sentido não está dado, mas é criado. Essa ideia é crucial para pensar os arquivos digitais como campos vivos e inventivos.

Gilbert Simondon — Filósofo francês da técnica e da individuação. Mostra que os seres técnicos (como microfones, CPUs ou algoritmos) também se individualizam e se relacionam com os humanos, numa co-evolução. Fundamenta uma visão relacional entre máquina e sujeito.

Yuk Hui — Filósofo sino-europeu, autor de "A Questão da Tecnologia na China" e "Recursividade e Cosmopolítica Tecnológica". Propõe uma ontologia da tecnologia não universalista, mas plural e recursiva, onde cada cultura desenvolve seus próprios regimes técnicos.

Boaventura de Sousa Santos — Sociólogo e jurista português, defensor da “ecologia de saberes”. Propõe um diálogo entre saberes populares, indígenas, acadêmicos e técnicos, sem hierarquização. Apoia a construção de um idioma digital que respeite a diversidade epistêmica.

Donna Haraway — Filósofa e bióloga feminista norte-americana, autora do Manifesto Ciborgue. Defende a hibridização entre corpo, máquina e linguagem. Sua obra inspira interfaces não binárias e formas de comunicação que transcendem o humano tradicional.

Bruno Latour — Sociólogo e antropólogo francês. Desenvolve a Teoria Ator-Rede, mostrando que objetos técnicos também têm agência. Sua noção de tradução é expandida: não só de palavras, mas de interesses, ações e efeitos.

Friedrich Kittler — Historiador da mídia alemão. Enxerga as mídias como dispositivos que moldam a percepção, a memória e a subjetividade. Sua noção de que “a mídia fala por nós” é essencial para uma crítica da linguagem digital automatizada.

2.1 Pensadores da Linguagem e Tradução

  • Walter Benjamin – "A Tarefa do Tradutor".
  • Jacques Derrida – Desconstrução da linguagem e o impossível da tradução total.
  • Vilém Flusser – Filosofia da comunicação e da técnica.
  • Cornelius Castoriadis – Imaginário social e criação de sentidos.
  • Gilbert Simondon – Individuação técnica e relações entre seres técnicos e humanos.
  • Yuk Hui – Cosmopolítica das tecnologias, recursividade e pluralismo digital.

2.2 Outros Pensadores-Chave

  • Boaventura de Sousa Santos – Ecologia de Saberes.
  • Donna HarawayManifesto Ciborgue.
  • Bruno Latour – Tradução como processo de mediação e agência.
  • Friedrich Kittler – Mídias como dispositivos inconscientes.

3. Núcleo de Ferramentas e Tecnologias

3.1 Softwares e Bibliotecas

  • whisper (OpenAI) – Transcrição multilíngue.
  • OpenSMILE (audEERING) – Extração de parâmetros vocais.
  • Praat – Análise fonética.
  • pyAudioAnalysis – Extração de características acústicas e classificação emocional.
  • Tensorflow.js, ONNX, HuggingFace Transformers – Execução de modelos IA em tempo real.

3.2 Bases de Dados

  • RAVDESS, CREMA-D, TESS – bases com fala emocional (inglês).
  • VoxEmo, EmoReact, MELD – multimodais.

4. Exemplos Comentados

A ser preenchido com:

  • Trechos de rodas de conversa transcritas.
  • Análises emocionais.
  • Visualizações simbólicas.
  • Comparações entre emoção percebida por humanos e por IA.

5. Mapas Conceituais (em construção)

  • "Mapa de Babel": articulação entre fala popular, máquina e arquivo sensível.
  • "Dialeto Digital Popular": vocabulário técnico-poético em desenvolvimento.

Coordenação: Rosenil Barros Orfã

Colaboração: Instituto Ideias no Lugar: Inteligência Artificial crítica, linguagem viva e escuta popular

“Não se trata de traduzir tudo para um mesmo idioma, mas de criar um campo onde todos os idiomas possam se escutar.”


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