Entre a servidão e a justiça: o humano em travessia
29ª Semana do Tempo Comum — Quinta-feira
Há textos que
não envelhecem porque falam menos do passado e mais do que se move dentro de
nós. A carta de Paulo aos Romanos, lida nesta quinta-feira da 29ª Semana do Tempo
Comum, é um desses lampejos em que a palavra antiga acende o presente. Ela nos
convida a olhar para dentro — e reconhecer que toda vida humana se desenrola
entre dois polos: o da servidão e o da liberdade.
Mas Paulo,
aqui, não fala da escravidão política, nem da liberdade civil. Fala do
território mais íntimo — aquele onde o corpo e a consciência se encontram.
“Outrora oferecestes vossos membros à impureza”, escreve ele, usando o corpo
como metáfora da vontade. Nossos gestos, impulsos e palavras são sementes:
podem gerar morte ou vida, desordem ou justiça.
O texto tem uma
lucidez rara. Não se trata de trocar um jugo por outro, mas de compreender que
a liberdade não é ausência de vínculos, e sim escolha consciente de quem
servir. O humano, diz Paulo, é sempre servo de algo — do egoísmo ou da
justiça, do medo ou do amor. O que muda é o senhor a quem entregamos nossos
dias.
A sabedoria
escondida nessa passagem é que a santidade não é moralismo, mas educação do
desejo. É quando o corpo aprende a servir à vida, e não ao seu contrário. A
fé, nesse sentido, não é fuga do mundo, mas retorno ao centro: é quando o ser
humano reencontra o eixo que o alinha à verdade, à beleza e à solidariedade.
E então, no
verso final, Paulo escreve uma das frases mais belas de toda a literatura
espiritual:
“A paga do
pecado é a morte, mas o dom de Deus é a vida eterna.”
Há aqui uma
geometria secreta: o que nasce do cálculo morre; o que nasce do dom permanece.
A morte, nesse texto, não é castigo — é consequência. A vida eterna, por sua
vez, não é prêmio — é fruto de uma harmonia restaurada. Quando o corpo, a mente
e o espírito respiram no mesmo ritmo, o tempo já não pesa: torna-se passagem, e
a eternidade começa no agora.
Nesta
quinta-feira do tempo comum, o convite é simples e radical: colocar os
próprios membros a serviço da justiça — que é o mesmo que dizer, a serviço
do amor. Pois só quem se faz servo do bem pode, um dia, chamar-se
verdadeiramente livre.
Tem Luta!
Sigamos!!
Foto: Aplicativos da Bílbia (aqui)
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𝓜ₕᵤₘₐₙₒ

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