A Teologia do Domínio e sua Influência na Política e Sociedade
Nos
últimos anos, a influência da teologia do domínio tornou-se um fenômeno
relevante no cenário político e social brasileiro. Este movimento teológico,
oriundo do neopentecostalismo e fortemente associado à chamada "Direita
Religiosa", carrega uma proposta de transformar a sociedade com base em
princípios bíblicos e cristãos. Neste texto, exploramos as bases dessa
teologia, sua relação com a teologia da prosperidade, e seu impacto em partidos
políticos, meios de comunicação e setores econômicos.
Conceitos
Básicos da Teologia do Domínio
A
teologia do domínio, também conhecida como dominionismo, parte da
premissa de que é dever dos cristãos influenciar todas as esferas da sociedade.
Esta visão é popularmente sustentada pela teoria das Sete Montanhas da
Influência, que incluem: governo, mídia, artes e entretenimento, economia,
educação, família e religião. A partir dessa perspectiva, os cristãos são
chamados a ocupar posições estratégicas nessas áreas, promovendo uma
transformação cultural e social em consonância com o que consideram ser o
"Reino de Deus".
No
entanto, o conceito de "Reino de Deus" adotado por esta teologia não
se refere a uma ideia ampla de justiça social, ética universal ou
espiritualidade transcendental. Em vez disso, ele é interpretado como um
projeto de poder concreto, no qual princípios morais específicos e normas
conservadoras são aplicados para moldar leis, políticas e práticas culturais.
Dessa forma, o "Reino de Deus" é traduzido em uma agenda política e
moral específica, promovida por líderes religiosos conservadores.
Paralelo
com a Teologia da Prosperidade
Embora
a teologia do domínio e a teologia da prosperidade compartilhem algumas
características comuns, como a crença na intervenção divina nas questões
terrenas, suas ênfases diferem em aspectos importantes. A teologia da
prosperidade, amplamente divulgada por igrejas neopentecostais, centra-se na
ideia de que a fé, acompanhada por ofertas e doações, leva ao sucesso
financeiro e à saúde física. A teologia do domínio, por outro lado, vai além da
esfera pessoal e prega a necessidade de moldar e influenciar toda a estrutura
da sociedade com princípios bíblicos.
Enquanto
a teologia da prosperidade é mais focada no indivíduo e suas conquistas
materiais, a teologia do domínio tem uma abordagem mais ampla e política,
enfatizando a transformação das instituições sociais e das estruturas de poder.
Partidos
Políticos e Alianças Estratégicas
A
influência da teologia do domínio na política brasileira se dá principalmente
através da formação de alianças estratégicas e do apoio a partidos
conservadores. A bancada evangélica no Congresso Nacional, por exemplo, atua
como um bloco coeso, promovendo legislações alinhadas aos valores cristãos e
utilizando um discurso que apela à moralidade e à defesa da família
tradicional.
Além
disso, os partidos conservadores e políticos populistas têm encontrado no
eleitorado evangélico um aliado estratégico. A aliança entre líderes religiosos
e figuras políticas cria uma narrativa de proteção contra supostas
"ameaças" à moralidade, como a "ideologia de gênero" e o
"comunismo". Essa conexão direta entre política e religião fortaleceu
a capilaridade desses movimentos nas campanhas eleitorais e nas estratégias de
conquista de votos.
Meios
de Comunicação e Mídia Religiosa
A
expansão da teologia do domínio também foi possibilitada pelo uso estratégico
dos meios de comunicação. Grandes conglomerados de mídia controlados por
igrejas, como a TV Record, de propriedade da Igreja Universal do Reino de Deus,
desempenham um papel fundamental na disseminação de discursos conservadores e
na promoção de candidatos alinhados aos seus interesses.
Além
disso, a proliferação de redes de rádio, canais de YouTube e mídias sociais
administradas por igrejas fortaleceu a capacidade dessas instituições de
influenciar debates públicos e moldar percepções políticas. Essa atuação
consolidou um espaço mediático para a divulgação de pautas religiosas e
conservadoras, aumentando o alcance e a influência dos líderes evangélicos.
Setores
Econômicos sob Influência
A
influência da teologia do domínio se estende também a setores econômicos
específicos. O movimento neopentecostal tem uma forte presença em segmentos
como a educação privada, serviços sociais e empresas de mídia. Instituições de
ensino geridas por igrejas promovem uma formação com ênfase em princípios
cristãos, enquanto redes de atendimento social baseadas em filantropia e
assistência são parte de estratégias de engajamento comunitário.
Além
disso, igrejas ligadas a essa teologia também atuam na criação de plataformas
digitais e aplicativos para arrecadação de doações e serviços religiosos,
promovendo um modelo de negócios que mescla práticas empresariais com preceitos
espirituais.
A
teologia do domínio representa mais do que um movimento religioso; trata-se de
uma estratégia social e política com impacto direto nas esferas de poder e na
organização da sociedade. Sua capacidade de mobilizar fiéis e consolidar
lideranças políticas alinhadas a suas pautas, aliada ao uso estratégico dos
meios de comunicação, é uma força considerável no cenário brasileiro. Ao
estabelecer um paralelo com a teologia da prosperidade, é possível entender
como essas duas correntes se complementam e moldam a forma como o poder é
exercido e disputado no Brasil.
A
influência dessa teologia nas eleições de 2024, marcada pelo avanço da direita,
revela um fenômeno de longo prazo, que depende de uma articulação profunda
entre religião, política e economia. O desafio para o campo progressista é
compreender as raízes desse movimento e criar respostas capazes de promover uma
sociedade verdadeiramente plural e inclusiva.
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Anexo
A
teologia do domínio é uma corrente teológica que surgiu dentro de segmentos do
cristianismo evangélico, especialmente nos Estados Unidos, e é amplamente
associada ao movimento neopentecostal. Ela se fundamenta na ideia de que os
cristãos têm o dever de exercer influência em todas as esferas da sociedade,
buscando estabelecer o "domínio" ou a "soberania" de Deus
sobre todos os aspectos da vida, incluindo governo, economia, educação, artes,
mídia, família e religião.
Origens
A
teologia do domínio tem suas raízes na década de 1970, quando líderes do
movimento neopentecostal começaram a promover a ideia de que a missão dos
cristãos não era apenas evangelizar e salvar almas, mas também transformar a
sociedade e ocupar posições de influência. Ela está fortemente ligada à
Doutrina do Reino, um conceito mais amplo e menos específico que enfatiza a
expansão do Reino de Deus na Terra.
Um
dos principais conceitos associados à teologia do domínio é a teoria das Sete
Montanhas da Influência. Esta teoria, popularizada por líderes como Bill
Bright e Loren Cunningham, postula que para transformar uma nação, é necessário
que os cristãos influenciem sete esferas específicas: governo, mídia, artes e
entretenimento, educação, economia, religião e família.
Representantes
Alguns
dos principais representantes e proponentes da teologia do domínio incluem:
- Rousas
John Rushdoony:
Considerado um dos pioneiros do pensamento reconstrucionista cristão,
Rushdoony foi um defensor de uma visão teocrática, na qual a sociedade
deveria ser governada por princípios bíblicos. Seu livro The Institutes
of Biblical Law é uma referência central para essa perspectiva.
- Francis
Schaeffer:
Embora nem sempre seja diretamente associado à teologia do domínio,
Schaeffer promoveu uma visão de engajamento cultural cristão que
influenciou muitos adeptos do movimento. Ele defendia uma postura ativa
dos cristãos na transformação cultural e social.
- C.
Peter Wagner:
Um dos principais líderes do movimento de crescimento de igrejas e do
movimento de guerra espiritual, Wagner foi um defensor da teologia do
domínio em seus ensinamentos sobre reforma apostólica. Ele é
conhecido por sua ênfase no papel de apóstolos modernos para influenciar
as esferas sociais.
- Lance
Wallnau: Um
dos defensores contemporâneos da teoria das Sete Montanhas. Ele
popularizou a ideia de que cristãos devem assumir papéis de liderança em
cada uma das "montanhas" para transformar a sociedade.
- Bill
Bright e Loren Cunningham:
Ambos são considerados os pais da visão das Sete Montanhas. Bright,
fundador da organização Campus Crusade for Christ, e Cunningham,
fundador da Jovens com uma Missão (YWAM), compartilharam a ideia de
que os cristãos deveriam se engajar proativamente em transformar a
sociedade.
Influências
e Críticas
A
teologia do domínio é frequentemente criticada por sua aproximação com a
política e seu envolvimento em agendas conservadoras e nacionalistas,
especialmente nos Estados Unidos. Muitos críticos argumentam que a teologia do
domínio promove uma visão teocrática, onde a política e a religião se
entrelaçam, colocando em risco os princípios de laicidade do Estado. Por isso,
a teologia do domínio é acusada de ser autoritária e de tentar impor uma visão
religiosa específica na sociedade.
Além
disso, muitos críticos alertam para a tendência de líderes que promovem essa
teologia de se aliarem a movimentos populistas e de extrema direita,
fortalecendo um discurso de "batalha espiritual" para justificar suas
ações políticas e sociais.
Síntese
A
teologia do domínio não é um movimento homogêneo, mas uma coleção de ideias e
práticas que compartilham a crença de que a missão dos cristãos inclui
transformar as estruturas sociais para refletirem princípios bíblicos. Em seu
núcleo, há uma convicção de que a fé cristã deve ser expressa de maneira
abrangente e influente na sociedade
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