Uma sabedoria tardia, um corpo vivo.
O corpo envelhece e com ele chegam as dores, persistentes e sempre novas, como se cada manhã fosse um recomeço incômodo. A velhice nos ensina que a dor não se apaga, mas se transforma em professora: é preciso reaprender a andar, reaprender a respirar, reaprender a existir. Se a juventude serviu para aprender e a maturidade para fazer, a velhice se revela como o tempo de reaprender tudo de novo e, talvez, fazer melhor — ainda que reste pouco tempo.
Mas
esse movimento não é apenas biológico. É também histórico e cosmológico.
Assim
como o corpo se regenera em suas células, o universo se refaz em estrelas que
morrem e renascem, e as culturas humanas se reinventam a partir de seus
próprios erros. O tempo humano não está separado do tempo do cosmos.
Carregamos
nos ossos o cálcio das estrelas, nas sinapses a memória da espécie, nos
símbolos as ilusões e as verdades de milênios. Não podemos, porém, falar apenas
de sabedoria como se fosse conquista serena. A história nos mostra erros,
enganos e pecados: o geocentrismo que aprisionou o olhar, o racismo científico
que hierarquizou vidas, a escravidão que se fez pecado consciente, a destruição
da natureza que persiste mesmo diante do alerta. Somos uma humanidade feita de
acertos parciais e equívocos persistentes.
Daí
a necessidade de reencontrar novas praças. Já não bastam os templos de
pedra, as catedrais, os sindicatos, as antigas assembleias. Hoje, a vida se
dispersa em telas e corredores de consumo, e o que era encontro se fragmenta em
mercadoria e fluxo de dados. Precisamos descobrir, inventar ou reconstruir
espaços onde seja possível perceber a vida em sua concretude: lugares de
partilha, de presença, de diálogo. Não “a praça única”, mas muitas praças —
digitais, comunitárias, simbólicas — capazes de devolver ao humano a sensação
de pertença e de sentido.
E
assim, entre dor e aprendizado, entre erro e esperança, entre corpo e cosmos,
podemos desenhar uma filosofia do cotidiano: uma sabedoria tardia que,
justamente por ser tardia, é mais livre, mais humana, mais próxima de uma vida
comum que não se impõe, mas se oferece como encontro, como presença, como
possibilidade de viver juntos.
Sigamos!
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