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Manifesto em Defesa da Democracia, Contra a Violência Política de Gênero e em Apoio à Vereadora Inês Paz

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O parlamento brasileiro é amplo, diverso e vital. Com seus três níveis de governo, composição federativa e representatividade popular, estende-se por todo o território de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, enraizado em seus 5.569 municípios, 26 estados e um distrito federal. É nesse espaço, fruto da luta histórica por cidadania e justiça social, que o povo exerce, ainda que de modo desigual e tensionado, o direito de fazer valer sua voz. O parlamento é o mecanismo vivo da democracia . Ali se molda, no tempo e na história, o destino da nação. Quando atacado em sua essência, todos nós somos atacados; e a própria história corre o risco de autodestruição. Isso ocorre quando a humanidade diversa que compõe o parlamento é ofendida em seu maior patrimônio: o decoro , que sustenta a dignidade de seus membros e a legitimidade da representação popular. Na cidade de Mogi das Cruzes , assistimos nascer um germe perigoso da negação da vida democrática. Durante sessão da Câmara Municipal, o v...

O Aprendizado Fraturado da Humanidade

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Há épocas em que a humanidade parece subir uma ladeira, lenta mas constante, levando nas costas a promessa de que o saber se acumula e se expande como o curso natural de um rio. Essa foi, por muito tempo, a fé oculta de quem acreditou no progresso, na ciência, na pedagogia: cada geração herdaria o fogo e acrescentaria sua centelha, até que, um dia, todos veriam a luz. Mas estamos numa época diferente. Aqui, o rio se partiu em mil afluentes que não convergem; aqui, a ladeira virou abismo. O aprendizado da humanidade, que parecia linha ascendente, mostra-se fraturado, estilhaçado em contradições profundas. De um lado, criamos inteligências artificiais que traduzem em segundos o que antes exigia vidas inteiras de estudo. Do outro, multiplicam-se os que acreditam que a Terra é plana, que vacinas matam, que ditaduras são saudáveis. O século XXI é, ao mesmo tempo, o da biotecnologia sofisticada e da superstição primitiva. O fascismo, que parecia ter sido derrotado pela memória dos camp...

Comunhão

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A comunhão é o instante em que percebemos que não existimos sozinhos. É o gesto de sentar-se à mesa, de partilhar o pão, de rir junto, de chorar junto. É a experiência de que a vida ganha sentido quando se abre ao outro. A comunhão não é fusão que apaga diferenças, mas encontro que as sustenta. É o milagre do plural: cada voz única compondo um canto coletivo. Poeticamente, a comunhão é imagem da roda. As mãos dadas, o corpo que dança, o canto que ecoa em muitas bocas, mas se torna um só som. É também silêncio compartilhado: dois que se olham e entendem sem palavras. A comunhão é a certeza de que a verdade não se guarda em cofres individuais, mas se expande quando é partilhada. Na prática, a comunhão se concretiza em gestos cotidianos. É a refeição feita em família ou em comunidade, onde o alimento se torna vínculo. É a assembleia popular, onde decisões são tomadas coletivamente. É o mutirão da roça, onde o trabalho se faz mais leve porque é feito em conjunto. É a solidariedade de q...

Esperança: um patrimônio da humanidade

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A esperança não pertence a um tempo, a uma cultura ou a uma fé particular. Ela é um patrimônio da humanidade, um fio invisível que atravessa séculos e gerações, renovando-se de acordo com as exigências de cada época.  Longe de ser mero consolo ou fuga, a esperança é sempre força vital, horizonte de sentido, impulso criador. Em cada momento da história, grandes pensadores a nomearam e a sustentaram de modos diversos, oferecendo chaves que ainda hoje podemos recolher e entrelaçar. Santo Agostinho a reconheceu como virtude teologal, inseparável da fé e da caridade.  Para ele, esperar é exercício de confiança em Deus, é disciplina interior que protege o coração contra o desespero e contra a presunção. Agostinho inscreve a esperança no campo da espiritualidade, como raiz que sustenta a vida humana diante da finitude. Séculos depois, Tomás de Aquino a descreveu como movimento da alma.  A esperança, em sua visão, é energia que nos lança em direção a um bem difícil, mas possível....

Uma sabedoria tardia, um corpo vivo.

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O corpo envelhece e com ele chegam as dores, persistentes e sempre novas, como se cada manhã fosse um recomeço incômodo. A velhice nos ensina que a dor não se apaga, mas se transforma em professora: é preciso reaprender a andar, reaprender a respirar, reaprender a existir. Se a juventude serviu para aprender e a maturidade para fazer, a velhice se revela como o tempo de reaprender tudo de novo e, talvez, fazer melhor — ainda que reste pouco tempo. Mas esse movimento não é apenas biológico. É também histórico e cosmológico. Assim como o corpo se regenera em suas células, o universo se refaz em estrelas que morrem e renascem, e as culturas humanas se reinventam a partir de seus próprios erros. O tempo humano não está separado do tempo do cosmos. Carregamos nos ossos o cálcio das estrelas, nas sinapses a memória da espécie, nos símbolos as ilusões e as verdades de milênios. Não podemos, porém, falar apenas de sabedoria como se fosse conquista serena. A história nos mostra erros, eng...

Entre o vazio e a Justiça Social.

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Vivemos uma época em que os velhos fundamentos se dissolvem. As promessas de eternidade, os dogmas da verdade absoluta e os falsos profetas da ordem já não sustentam a vida. O niilismo nos revela isso sem disfarces: nada está garantido . Esse vazio não é derrota. É a mais radical das ousadias: olhar de frente o nada e nele encontrar a possibilidade de recriar o mundo. Se o céu está vazio, o chão está vivo. É na matéria histórica — no corpo, no trabalho, na luta — que se ergue o espaço da existência humana. O materialismo nos recorda que não somos espectros perdidos no cosmos: somos seres concretos, tecedores de história. O que não podemos experienciar no infinito do universo, podemos transformar no finito da terra, da cidade, da comunidade. A radicalidade da matéria nos convoca a agir aqui e agora, não em outro lugar. Do niilismo nasce uma responsabilidade: já que não existe sentido dado, somos nós que devemos criar. A justiça social não é presente dos céus, mas conquista human...

Michel Siffre: O homem que desceu à escuridão para medir o tempo

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Em 1972, o cientista e espeleólogo francês Michel Siffre decidiu repetir — de forma ainda mais radical — uma experiência que já havia conduzido dez anos antes. Ele se trancou numa caverna a cerca de 440 pés de profundidade, isolado por 180 dias, sem luz solar, sem relógio e sem contato humano direto. O objetivo não era resistência física, mas investigação: compreender como o corpo e a mente regulam a percepção do tempo na ausência de qualquer referência externa. Siffre, formado em geologia e apaixonado pela psicologia do tempo, acreditava que a chave para entender aspectos profundos da nossa natureza estava na relação entre o relógio biológico e o ambiente. Ao eliminar os marcadores habituais — nascer e pôr do sol, horários de refeições, vozes, sons da vida urbana — ele pretendia observar o funcionamento “nu” do ciclo humano de sono e vigília. O método e a experiência Nos primeiros dias, tentou manter uma rotina guiando-se apenas por sinais internos, como fome e sono. Mas, sem lu...