Inversão de Prioridades Ontem e Hoje: Lições do Governo Popular de Suzano (2005–2012) e os Desafios da Reconstrução


Revisitar o passado pode ser um gesto profundamente político. Hoje, ao reler o texto publicado em maio de 2011 no Blog Plebeu, que narrava a transformação vivida pelo povo do Ramal São José, em Suzano-SP, volto a me encontrar com uma experiência histórica concreta que ajudei a construir como Secretário de Participação Popular no governo Marcelo Candido (2005–2012). Aquela reflexão, escrita no calor dos acontecimentos, relatava não só a reurbanização de um bairro, mas o início de um novo tempo na cidade: um tempo de dignidade, de inclusão e de justiça social.

O governo que integrávamos foi orientado por cinco eixos estratégicos: combate à corrupção, inclusão social, desenvolvimento sustentável, cidade legal e participação popular. Não eram apenas palavras de ordem, mas guias de ação concreta. Com elas, estruturamos políticas públicas que mudaram a realidade de dezenas de milhares de pessoas. A regularização fundiária em mais de 82 áreas, os planos municipais de saneamento e mobilidade urbana, a política de segurança alimentar, a democratização da educação, o fortalecimento da cultura e dos esportes, a reestruturação do centro urbano e, sobretudo, a implementação do Sistema Único de Saúde, que até então não estava plenamente implantado no município.

Mas há um eixo fundamental que precisa ser destacado com o devido peso: a política de desenvolvimento humano e inclusão social. A área de Assistência Social foi completamente reorganizada, rompendo com uma prática arcaica e conservadora: a do primeiro-damismo, que utilizava a vulnerabilidade das pessoas para promover a imagem da primeira-dama e do prefeito. Nada contra as pessoas, mas tudo contra uma política que se apropria da dor alheia para se autopromover.


Inspirados na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) e em sintonia com as diretrizes do governo federal à época, implementamos uma política pública de Estado — com base em direitos, não em favores. Foram criados os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) nos distritos de Palmeiras, Boa Vista, Centro e Casa Branca, além do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS). Essa rede formava a espinha dorsal de uma política que reconhecia o povo empobrecido de Suzano como sujeito de direitos, e não como massa de manobra.

O caso do Ramal São José foi emblemático. Um loteamento irregular, marcado pela ausência de políticas públicas e pela invisibilidade, passou a ser tratado como prioridade. Ali, urbanização e regularização não foram apenas obras de infraestrutura, mas atos de reconhecimento político da dignidade de um povo. Como dissemos à época: “o cotidiano se dá e se transforma”. E de fato se transformou — pela força da comunidade e pela existência de um governo disposto a escutá-la.

No entanto, ao longo dos anos seguintes, esse processo foi interrompido. Vieram gestões que priorizaram a propaganda em detrimento do planejamento, que usaram as redes sociais para encobrir a ausência de políticas públicas consistentes, e que promoveram um tipo de “gestão” desconectada da vida real da maioria da população. A cidade legal foi desfigurada. A inclusão social se transformou em peça de marketing. A sustentabilidade deu lugar à especulação. A participação popular foi esvaziada, e o combate à corrupção perdeu centralidade.


Suzano sempre foi uma cidade rica. Mas seu povo, historicamente empobrecido, foi mantido às margens do desenvolvimento. A experiência vivida entre 2005 e 2012 rompeu com essa lógica e provou que outro caminho era possível. A reconstrução desse projeto, agora sob novas condições históricas, torna-se novamente urgente.

Essa realidade exige de nós um esforço coletivo de memória e de projeto. A releitura crítica dos textos do Blog Plebeu pode ser um ponto de partida. Não se trata de saudosismo, mas de uma pedagogia da prática: entender o que foi construído, o que foi perdido, e o que ainda precisa ser feito.

Sabemos que há limites e erros que precisam ser reconhecidos. Mas é igualmente importante afirmar os acertos e defender a ideia de que um outro projeto de cidade é possível — e já foi vivido. E se foi possível uma vez, pode voltar a ser. Mas isso exige organização, consciência e protagonismo popular.

Estamos diante de uma cidade que precisa reencontrar sua alma coletiva. Que precisa resgatar a esperança como força política. Que deve olhar para frente sem esquecer o caminho que já percorreu.

Que essa releitura seja um convite. Um convite à reconstrução. Um chamado à retomada da luta por uma Suzano democrática, justa, humana e viva.

Sigamos!


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