A dor de incluir: o que revela o Dia Nacional da Educação Inclusiva
Lembro da primeira vez em que vi um estudante com deficiência sendo deixado de lado durante a aula. Estávamos todos ali, no mesmo espaço, mas não na mesma experiência. Enquanto seguíamos os exercícios, ele era deixado sob a guarda de uma monitora, isolado — como se sua presença fosse um gesto de caridade, não um direito.
Foi
ali que me caiu a ficha: aquela escola não era, de fato, para todos. Era para
quem se encaixava. Para quem aprendia “no tempo certo”, para quem conseguia
acompanhar a norma, para quem não “atrapalhava”.
Hoje,
ao lembrar disso no 14 de abril, o chamado Dia Nacional de Luta pela
Educação Inclusiva, não consigo sentir comemoração. Sinto incômodo. Sinto
denúncia. Porque, se precisamos de uma data como essa, é porque o sistema
educacional falhou — e segue falhando — em garantir o mais básico: o direito de
aprender com dignidade.
A
expressão “educação inclusiva” já nasce marcada por uma contradição. Se a
educação fosse de fato o que promete ser — instrumento de emancipação, de
justiça, de igualdade — ela não precisaria desse adjetivo. A inclusão deveria
ser princípio, não exceção. Mas vivemos em um mundo onde é necessário lembrar
que incluir é preciso, porque excluir continua sendo a regra.
E
por que isso acontece?
Talvez
porque carregamos, nas entranhas do sistema educacional, uma lógica de disputa.
Competição, ranking, méritos. Tudo isso parece natural, inevitável. Mas não é.
Foi construído. E pior: foi naturalizado. E, assim, seguimos premiando os
“melhores” — os que já saíram na frente, os que têm condições, apoio, corpo
saudável, mente treinada. E os outros? Que se virem. Ou, no máximo, que recebam
“atenção especial”.
Mas
atenção não é inclusão. Assistência não é justiça. E boa intenção não é
transformação.
A
educação inclusiva só será real quando a escola for espaço de solidariedade.
Quando cada pessoa for percebida como única e insubstituível, com seu
tempo, sua trajetória, suas limitações e suas potências. Quando a escola, em
vez de enquadrar, abrir-se para acolher. Isso exige uma mudança profunda. Não
apenas no currículo, mas no coração do projeto educacional.
O
texto que circula hoje, lembrando a importância da gestão democrática,
aponta um caminho possível. Quando a comunidade escolar participa — estudantes,
famílias, professoras, funcionárias, vizinhos — a escola deixa de ser torre e
passa a ser praça. Escuta-se mais. Decide-se junto. Muda-se com mais coragem.
A
gestão democrática, então, não é só técnica. É um ato de alteridade. Um
compromisso com o outro — não como problema a ser resolvido, mas como sujeito
com quem se caminha. É onde o sonho da inclusão começa a virar prática.
Por
isso, o 14 de abril precisa ser vivido como provocação. Como dor. Como memória
de que seguimos falhando. Mas também como semente de reinvenção. A educação só
será inclusiva quando for também justa. E só será justa quando for humana em
profundidade.
Enquanto
houver alguém excluído da escola, a escola não estará completa
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